Revelado pelo Flamengo, clube de maior torcida do Brasil, o ex-lateral Cassio chegou na Austrália em 2007 como reforço do Adelaide United, graças à passagem de Romário pelo clube, que embora sem sucesso, criou conexões para sua contratação.
15 anos depois, ele fixou residência na Austrália, deixou um belo legado no clube pelo qual atuou e no futebol australiano, e tem dois filhos que são australianos de alma e talento brasileiro, vistos com grande potencial para os Socceroos, num futuro próximo.
Cassio é um dos personagens da série de podcasts “Uma pitada de Brasil no futebol australiano”, da SBS em Português.
Início da trajetória na Austrália
Cassio conta que parar na Austrália foi algo atípico. Que em 2007, época que chegou no país, esse era um mercado totalmente alternativo, com poucos brasileiros.
"Por sorte tinha um brasileiro muito conhecido, o Romário. Por causa dele as coisas se alavancaram e então minha história começou aqui na Austrália”.
Por sorte tinha um brasileiro muito conhecido, o Romário. Por causa dele as coisas se alavancaram e minha história começou na Austrália.Cassio, ex-jogador do Adelaide United
Sem ainda entender bem o inglês nos seus primeiros anos de Adelaide United, time em que atuou por sete temporadas, Cassio contrariou as orientações defensivas de seus treinadores jogando um futebol ofensivo, clássico da cultura brasileira. Foi tão bem que criou um novo parâmetro para sua posição na Austrália.
Cassio afirma que trouxe uma cultura diferente para a Austrália pois o lateral no Brasil é um jogador mais ofensivo do que defensivo.

Cassio defendendo o Flamengo contra o Palmeiras em 2002. Ele foi revelado pelo clube carioca, onde atuou por alguns anos. Source: Supplied / Eduardo Viana/Lancepress
Referência como lateral no futebol australiano
Cassio conta que quando os treinadores viam que dava certo o que ele fazia em campo como lateral-esquerdo falavam: "Peraí, ganhei uma arma ofensiva sem querer".
"Eu aparecia bastante e acredito que com essa naturalidade, virei uma referência para as laterais. Quando os clubes australianos foram ao mercado contratar jogadores, principalmente nesse perfil, eles olhavam muito o que eu fazia”.
Eu aparecia bastante (como lateral-esquerdo) e virei referência. Quando os clubes iam contratar jogadores, olhavam muito o que eu fazia.Cassio, ex-jogador do Adelaide United
A qualidade de vida na Austrália, um dos principais fatores que fizeram Cassio decidir ficar no país, também foi uma das motivações para sua vinda em 2007, já que ele sofreu durante toda sua carreira no Brasil com atraso de salário por exemplo.
“Eu vim por uma oportunidade de trabalho, tentar um mercado diferente. Os clubes na minha época no Brasil tinham dificuldade em pagar salários. Em todos os clubes que trabalhei não recebi salário em dia. Até hoje tem clube que me deve”.
Os clubes na minha época no Brasil tinham dificuldade em pagar salário em dia. Passei por isso em todos os clubes que trabalhei. Até hoje tem clube que me deve.Cassio, ex-jogador do Adelaide United
Convite para atuar na seleção australiana
Suas boas temporadas com a camisa dos Reds de South Australia o renderam um convite para defender a seleção australiana em 2012.
Cassio passou por todo o processo de naturalização, mas uma mudança inesperada no comando técnico dos Socceroos fez com que a convocação não viesse.

Cassio quase chegou à seleção australiana quando tinha 32 anos, mas a troca de técnico o impossibilitou de jogar com os Socceroos. Source: AAP / PAUL MILLER/AAPIMAGE
Segundo Cassio, a possibilidade de atuar na seleção australiana surgiu pelo convite do alemão Holger Osieck (ex-treinador dos Socceroos).
"Eu já tinha 31 anos pra 32 anos, mas estava numa fase muito boa fisicamente. Até então eu não era australiano e tinha uma proposta pra voltar pro Brasil. Então falei: ‘eu aceito, mas eu quero que esse processo de naturalização seja para toda minha família’. E foi o que aconteceu".
Cassio conta que quando estava pra acontecer a convocação, o Holger Osieck caiu e foi substituído pelo Ange Postecoglou (atual treinador do Celtic, da Escócia).
"E aí acabou que não fluiu, mas acredito que eu também não me levaria. Na época claro que eu queria ir, mas hoje, analisando friamente, eu daria a oportunidade para um jogador mais jovem”.
Quando estava pra acontecer a convocação (para a seleção), o Holger Osieck caiu e foi substituído pelo Ange Postecoglou, e aí acabou que não fluiu.Cassio, ex-jogador do Adelaide United
Torcida brasileira x torcida australiana
Com passagens na carreira por clubes como Flamengo, Internacional, Ceará e Santa Cruz, no Brasil, Cassio viveu na pele a pressão de jogos importantes diante de milhares de pessoas em grandes estádios e a comparação com o futebol australiano é clara. Para ele não existe pressão por aqui.
“Em um jogo do Flamengo com 15 ou 16 anos você tem mais pressão do que aqui no profissional. Já tomei pedrada na cabeça, já perdi pênalti na final, já fiz gol em final com 80, 90 mil pessoas".
Cassio diz que quando veio jogar na Austrália em 2007 e via os jogadores jovens antes dos jogos tremendo, ele achava a cena "um pouco engraçada".
"A torcida aqui não vaia, que é uma coisa boa, é da educação do país, enquanto o brasileiro é muito passional".
Em um jogo do Flamengo com 15 ou 16 anos você tem mais pressão do que aqui no profissional. A torcida aqui não vaia, que é uma coisa boa, da educação do país.Cassio, ex-jogador do Adelaide United
Por conta disso, para Cassio, a transição dele do futebol brasileiro para o australiano foi muito tranquila.
"Eu já tinha 27 anos, mais de 300 jogos profissionais na carreira e por esse fator, pelo meu currículo, eu pude ajudar bastante jogadores nesse período de transição de jovem para profissional”.
Treinar novos talentos, incluindo os filhos
Hoje, oito anos após encerrar sua carreira profissional, Cassio administra sua academia de futebol, criada logo após pendurar as chuteiras.
O trabalho na formação de talentos com um toque brasileiro, já começa a render frutos. Dentre alguns atletas com oportunidade em grandes clubes do país, dois em especial Cassio aponta com orgulho, seus filhos Bernardo e Henrique.

Aos 18 anos, Bernando, filho de Cassio, já atua profissionalmente no Adelaide United e defende as seleções de base da Austrália. Source: AAP / AAP Image/Matt Turner
Hoje faz parte do elenco da seleção olímpica australiana e se prepara para ganhar mais protagonismo na nova temporada da A-League.
O mais novo, Henrique, de 13 anos, chama atenção pela força física, competitividade e qualidade com a bola nos pés. Já disputa seus primeiros torneios interestaduais e começa a chamar a atenção de clubes.

Henrique, de 13 anos, filho de Cassio, já disputa seus primeiros torneios interestaduais e começa a chamar a atenção de clubes. Source: Supplied
Eles (os filhos Bernardo e Henrique) tem uma coisa meio diferente do jogador australiano, de querer ser vencedor, algo que eu tinha quando era jovem.Cassio, ex-jogador do Adelaide United
Cassio diz que passa para os filhos que para chegar onde querem eles tem que querer mais que os outros, "senão vai ter outro que vai te atropelar. Infelizmente o futebol é assim".
E afirma: "eles tem tudo pra chegar, a gente dá todo suporte pra eles. Sem deixar o estudo de lado, é claro, eles tem todo potencial de chegar em um clube de ponta na Austrália ou jogar em um mercado maior como na Europa".
Essa entrevista com Cassio faz parte da série de seis episódios da SBS em Português "Uma pitada de Brasil no futebol australiano.
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